domingo, 10 de maio de 2009

Uma alegria para sempre |

As coisas que não conseguem ser
olvidadas continuam acontecendo,
Sentimo-las como da primeira vez,
sentimo-las fora do tempo,
nesse mundo do sempre onde as
datas não datam. Só no mundo do nunca
existem lápides...Que importa se -
depois de tudo - tenha "ele" partido,
casado, mudado, sumido, esquecido,
enganado, ou que quer que te haja
feito, em suma? Tiveste uma parte da
sua vida que foi só tua e, esta, ele
jamais a poderá passar de ti para ninguém.
Há bens inalienáveis, há certos momentos que,
ao contrário do que pensas,
fazem parte da tua vida presente
e não do teu passado. E abrem-se no teu
sorriso mesmo quando, deslembrado deles,
estiveres sorrindo a outras coisas.
Ah, nem queiras saber o quanto
deves à ingrata criatura...
A thing of beauty is a joy for ever
- disse, há cento e poucos anos, um poeta
inglês que nã conseguiu morrer.

(Mario Quintana)

Para Léo, que viverá pra sempre no meu presente.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

poeminha infantil

A chuva faz um barulhinho bom.
Um chiado.
Meu coraçãozinho aperta, treme
Como se tivesse sido molhado.

Será que a chuva o molhou?
Mas,quando, que eu não vi?
Será que eu dei as costas pra ele
E ainda não percebi?

Agora me sinto mal
E ele está frio, gelado
Não posso mais aquecê-lo
Vamos continuar brigados.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Ao me olhar no espelho senti a proximidade nua de nossos corpos. Suor como viga, como cola, calor imenso, desfiguraçãode gente num grito de bicho, e um abraço depois. Não tive dúvidas do que tinha que fazer, detalhe por detalhe cada umadas coisas. Imaginei cada cena, cada ação, o que se faria ver, o que seria necessário esconder. A distância era necessária.Desde lá senti muito frio, tanto frio que tive que colocar o casaco, as luvas e um gorro na cabeça. Não era um frio qualquer,era estranho. As pontas dos dedos quentes, a cabeça quente, os pés, as pernas, cada fio no seu lugar: o frio era imenso,no estômago: dor e frio; e as pernas se contorcendo.---------------enquanto isabela falava, eu olhava para os lados, lia as placas de propaganda, observava uns garotos comendo na lanchonete,copos de milk shake na lata de lixo. Nada fazia muito sentido. Calafrios repetidos e agudos, o cheiro do cabelo dele, que subia de alguma cabeça desconhecida, diferente daquela que se esfregou por todo o meu corpo, ou que simplesmente vinha como uma lembrança, fruto da minha vontade e imaginação.Mas nada me faria perder a pose. Nada me faria ter que explicar o que se passava ali dentro. Até por não saber.A puxei pelo braço num impulso só e corri. Já sei, vamos ao cinema, tem um filminho bobo que estou louca pra ver. Tudo perfeitamente certo. Sessão começando em quinze minutos, o tempo da pipoca, uma ida ao banheiro e pronto. Ali dentroestaria mais tranquila. Era o que precisava para me recompor.Entraria naquela história e me esqueceria um pouco de tudo.Como se eu já não estivesse com grande dificuldade me entregar àquela tela, Isabela me trazia de volta à realidadea cada intervalo de cinco minutos. Num determinado momento a voz dela já me dava enormes dores de cabeça, tive que arrumar uma saída urgente. Mal,muito mal. É, devo ter comido alguma coisa que não me fez bem. Tenho mesmo que ir, desculpa. Depois nos falamos. O filmeera mesmo muito ruim. E se estivesse por ali me vendo? Vendo que eu estava vendo aquele filme, me acharia uma ridícula.Não sabe que fui ali pra fugir.---------------------Cheguei em casa numa angústia só. Deitei na cama e fechei os olhos por alguns breves minutos, que custaram a passar. Cheguei até a dar um cochilo, mas quando se está ansioso, é como se tivesse um despertador enchendo o saco o tempo inteiro, e te lembrando do quão você é obrigado a sentir tudo aquilo. A barriga encolhendo como se fosse sumir: o estômago. Banho quente, muito quente. Deixei encher a banheira, a fumaça embaçando o espelho, me joguei ali por uma hora. Abri todas as janelas, deitei no chão da sala, deixei o vento secar o meu corpo. Abri um pouco as pernas e tentei não sentirvergonha de senti-lo assim, tão perto. Levantei, abri a geladeira, mas nada ainda me fazia ter vontade de comer. Decidi não insistir. Em algum momento eu iria ser salva pelas minhas necessidades biológicas. Peguei um livro. Esse seria meu projeto para a próxima semana. Ter lido as vinte páginas que "li" ou nenhuma, daria no mesmo.Vou dar uma volta.Me arrumei, coloquei um vestidinho que sempre me fez sentir melhor,uma sandalinha rasteira e um perfume leve, e sai andando.Ser paquerada talvez me deixasse um pouco melhor. Passando numa pracinha ouvi risadas escandalosas de pessoas que meirritavam profundamente por demostrarem uma felicidade surreal pra vida de qualquer pessoa que viva nesse lugar.Andei mais um pouco e senti alguns rostos olhando pra mim. Não era um rosto que eu queria ver. Entrei num pub e comeceia dançar. Provocava como podia. Sabia que ele não estava ali, mas minha imaginação estava tomando conta disso por mim.Me senti bem de ver em todos aqueles outros, ele. Mandei ficarem quietos para que a voz dele pudesse surgir na minha cabeça econtinuei me exibindo. Meus dedos tremiam, e eu queria que ele pudesse ver isso.A frustração bateu forte, me deu um soco. estava vivendo esses últimos dias como se ele estivesse me observando.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

cheiro de pinho...





Tirou lentamente o sutiã. Gostava de olhar o seu corpo no espelho, em especial os seus seios. Pequenos, quase irreais, mas firmes. Entrou no chuveiro, tão logo fechou a cortina de plástico, que a cercou como uma muralha de brinquedo. O cheiro de pinho, que subia do sabonete, ultrapassava a muralha de plástico e se misturava ao ar que pouco circulava. Ela se ensaboou com uma esponja macia, que passeava devagar por cada parte do seu corpo, como se estivesse desenhando-o. Brincava com aquele objeto que gerava um prazer quase imperceptivel.


O banho: "parêntese da seca e vestida existência". Assim nua, libertava-se do tempo, voltava a ser apenas o corpo eterno, oferecido ao sabão de pinho e à água quente do chuveiro. Permaneceu alí por um bom tempo. Sabia que no momento em saísse do banho, colocando a mão para além daquela muralha e pegando a toalha, na qual enrolaria todo o seu corpo, voltaria ao seu tédio de mulher vestida, "como se cada peça de roupa a fosse prendendo à história, devolvendo-lhe cada ano de vida, cada recordação, grudando-lhe o futuro no rosto como uma máscara de barro".